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Michel Foucault e a microfísica do poder

 

MICHEL FOUCAULT E A MICROFÍSICA DO PODER1

Prof. M. Alexandre Lobo

Desde o surgimento da teoria sociológica, as análises partiam do princípio que o que interessava eram os fenômenos coletivos, resultados não da mera soma de indivíduos mas da interação destes. Os indivíduos, entendidos como simples peças de uma grande máquina, a sociedade, eram relegados a segundo plano ou mesmo esquecidos como se fossem meros reflexos das formações sociais. O poder, neste sentido era entendido somente como emanado de cima para baixo, do Estado, impondo suas regras aos indivíduos. Essas análises são o que chamamos de macro, pois buscam desvendar os grandes sistemas, sejam eles econômicos, políticos ou sociais. As pessoas eram vistas então como resultado de suas posições de classe social. Mas, a partir dos anos sessenta, com a percepção de que o operário não era apenas um trabalhador, mas também um pai de família, um torcedor e que tinha uma opção sexual, passou-se a buscar mais o individual nas análises das ciências humanas. Surge então as análises micro, focando o indivíduo e suas relações. Para esta nova abordagem, foi importante o pensamento de Michel Foucault e seu conceito de microfísica do poder.

Nas análises tradicionais, o poder estava concentrado no Estado, centro regulador da sociedade. Karl Marx entendia o Estado como um aparato montado a favor das classes dominantes, como um orgão repressivo destas para manter a existência da propriedade privada. Max Weber entendia o Estado como detentor do monopólio do uso da força através de seu aparato armado. Já Emile Durkheim entendia o Estado como o cérebro de um organismo. Todas essas análises entendem o poder como algo pairando sobre os indivíduos, como se estes não fossem responsáveis por ele.

Em uma perspectiva micro, o poder é entendido, não como uma entidade ou algo que tenha um local determinado para acontecer, mas sim como estando em todos os lugares. Não existe “o poder”, mas somente relação de poder. Flutuante, não há alguém que o detenha. É nas práticas cotidianas que ele se realiza. A repetição das relações que estabelecem quem cria as regras e quem as cumpre o mantém presente na mente dos indivíduos. Ele está em todos os lugares onde haja mais de um sujeito, ou seja, todas as relações, de uma forma ou de outra, são relações de poder, mesmo que não percebidas enquanto tais. Sendo uma relação, onde o poder for exercido, existe também uma resistência. Com sucesso ou não, desrespeitar regras ditadas pelos detentores momentâneos de poder é uma forma desta resistência.

Sendo uma relação e não um objeto ou um local, o poder, e a resistência a este, não necessariamente é visível. Pode esconder-se em uma tradição, em uma moral ou mesmo nas relações afetivas. Segundo Foucault, quanto mais escondido o poder estiver, mais eficaz o será, pois os dominados não perceberão a relação de dominação e assim não resistirão.

O local em que o poder é exercido é o corpo, é na disciplina, no controle das funções fisiológicas que o domínio se exerce da melhor forma. E é nele em que são aplicadas as medidas disciplinares, como a violência, por exemplo. A formação de filas, em qualquer lugar, as distribuições de alunos em lugares específico na sala de aula ou ainda a organização de soldados que se apresentam para a revista de seus superiores são formas de organizar indivíduos.

As análises micro trouxeram uma importante contribuição para as Ciências Humanas, mas, por vezes, esquecem que os indivíduos estão inseridos em uma estrutura maior que limita suas possibilidades de ações. O desafio maior é conjugar as análises micro e macro para melhor compreender os fenômenos humanos.

 

FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1990. 9º edição.

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